sexta-feira, 27 de julho de 2012

Sozinhos no vazio

Em algum momento deste ano, a sonda Voyager 1, lançada da Terra 35 anos atrás, vai cruzar uma fronteira que nenhum objeto criado pelo homem jamais alcançou. Passando por uma onda de choque impulsionada pelo Sol nos limites do sistema solar, ela vai chegar aos gelados domínios do espaço interestelar. A Voyager é uma das naves mais rápidas que já conseguimos mandar para fora do raio de atração da gravidade da Terra. Ainda assim, depois de três décadas e meia de vôo espacial hiperveloz, a sonda ainda vai precisar de outros 700 séculos até chegar perto da estrela mais próxima. Na ausência de um milagre científico do tipo que nunca vimos ocorrer, a história dos nossos milênios futuros transcorrerá na Terra e no "espaço próximo", o ambiente formado pelos outros sete planetas, suas luas e os asteróides entre eles. Apesar de todos os vôos da nossa imaginação, ainda não absorvemos essa realidade. Quer gostemos ou não, estamos provavelmente presos ao sistema solar por muito, muito tempo. É melhor começarmos a nos conformar com o significado disso para o futuro dos seres humanos. É claro que, num certo nível, sabemos disso. Mas, numa cultura saturada de noções de "progresso" cultivadas internamente e da obsessão por mundos aparentemente próximos do nosso alcance, existe a expectativa de que construiremos uma cultura interestelar mais cedo do que seria razoável crer. Numa espécie de versão cósmica do Destino Manifesto, supomos que, a não ser que algo terrível ocorra, nossa ciência vai nos levar às estrelas em algum momento das próximas centenas de anos. Tente mencionar um "motor de dobra" a qualquer pessoa e veja se ela sabe do que você está falando. De Jornada nas Estrelas a Guerra nas Estrelas, dos motores de dobra ao salto no hiperespaço - a idéia da viagem interestelar é um meme tão profundo nas visões culturais do espaço e do nosso futuro que os filmes de Hollywood nem precisam perder tempo apresentando-a ao público. Basta puxar uma alavanca e zap - estamos num novo sistema estelar. Quantas pessoas ficariam surpresas em saber que o motor de dobra não é nem mesmo um conceito coerente, quem dirá uma tecnologia para o futuro próximo? A verdade é que nós nos lançamos no espaço usando basicamente os mesmos princípios físicos com os quais os chineses brincavam quando descobriram aquilo que aprendemos a chamar de pólvora há mais de 1.400 anos. Explodir alguma coisa sob nossos pés é basicamente a única maneira que conhecemos de viajar pelo vazio. Mas, para as distâncias que separam as estrelas, esse método simplesmente não será suficiente. Mesmo que conseguíssemos descobrir uma forma de aumentar em cem vezes a velocidade de nossas naves espaciais - um aumento proporcional à diferença de velocidade entre uma carroça puxada por cavalos e um avião a jato 747 - elas ainda precisariam de quase mil anos para chegar às estrelas mais próximas e um período igual para a viagem de volta. Por mais que estejam em curso animadoras pesquisas teóricas envolvendo o envio de sondas não tripuladas às estrelas, a possibilidade real de uma cultura humana interestelar de larga escala é muito menos animadora. Mundos alienígenas. Pense nisso. Nada de salvação para a pressão populacional nas praias de mundos alienígenas. Nada de libertação das ameaças da degradação da biosfera na promessa de novas biosferas. Nada de fuga das nossas próprias tendências destrutivas na colonização das estrelas, espalhando a semente humana ao vento solar. Por épocas futuras tão numerosas quanto as épocas passadas da história humana, é provável que tenhamos de nos valer daquilo que temos, improvisar e, no fim, aprender a conviver. A partida da Voyager em sua missão interestelar convenceu-me de que estávamos avançados no nosso rumo àquele futuro grandioso no qual tudo seria possível. Hoje, ainda fico impressionado com aquela pequena caixa eletrônica que singra o espaço até os limites do vento solar. Ainda acredito que ela representa o máximo do gênio humano, de nossa ambição e esperança. E acredito que é por meio dessas qualidades que conseguimos aprender a dimensão completa das estrelas. Embora os netos dos netos dos nossos bisnetos possam viver para conhecer uma tecnologia cada vez mais poderosa, eles também terão de conviver mais intimamente com bilhões e bilhões de outros bem aqui, no nosso cantinho do cosmos. Pensando no passado e no futuro, aposto agora que o gênio, a ambição e a esperança da humanidade possam se superar em nome desse desafio. Não teremos outra escolha. Não haverá nenhum outro lugar para irmos por muito tempo.

Créditos: Estadão

2 comentários:

  1. caro LAWRENCE meu nome é EDUARDO, descobri seu blog recentemente e gostei bastante do conteudo e, com sua permissão o espiarei diariamente.
    essa sua postagem (sozinhos no vazio) é assustadoramente realista. eu sou totalmente leigo no assunto mas muito apaixonado pela astronomia. mas diante de tudo que já lí sobre o assunto, a opinião que tenho hoje é bem parecida com a sua! acho que somos prisioneiros do nossos próprios limites. quando digo limites eu me refiro a vários fatores, por exemplo
    o nosso organismo que é muito frágil diante das inimagináveis adversidades que uma viagem cosmica traria.
    outra opinião que gostaria que voce comentasse é com relação ao tempo/espaço: quase todas as opiniões que são dadas sobre a existencia de aliens é sobre "onde eles estão"! eu acho que tres questionamentos devem ser feitos: em que lugar eles existem, em que lugar eles existiram ou em que lugar eles existirão. falo isso me baseando na irrelevante fração de tempo que é a existencia humana comparada a idade do universo. e, se desse pequeno tempo do homem voce ainda levar em conta apenas o tempo em que passamos a ter tecnologia pra receber algum tipo de mensagem vinda do espaço, fica totalmente nula a possibilidade de encontrar alguma coisa. resumindo meu pensamento de leigo: vamos pre-supor a existencia de um milhão de civilizações inteligentes em todo o universo. levando em consideração a idade do universo e o tempo da nossa civilização, eu imagino que: 49,99% dessas raças já existiram, 49,99% ainda irão existir e apenas 0,02% existem no tempo exato do homem.
    caro LAURENCE, lógico que isso talvez seja apenas um de um leigo, de qualquer forma estarei sempre visitando esse espaço super interessante.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Grande Eduardo, desde já, obrigado pelo elogio e sinta-se completamente à vontade para ler e estudar o que postamos aqui.
      Em relação aos assuntos alienígenas, creio sim que milhares de civilizações já existiram e até nem existem mais, e outras como a nossa que está apenas surgindo no universo, assim como também acredito que novas civilizações surgiram ao longo do próximos milhões ou bilhões de anos, mas se formos falar desse assunto agora, eu iria ocupar seu dia inteiro. :-)
      Obrigado pelo comentário e volte sempre!

      Excluir