terça-feira, 23 de abril de 2019

Cassini revela surpresas nos lagos de Titã

No seu último "flyby" pela maior lua de Saturno em 2017, a sonda Cassini da NASA recolheu dados de radar que revelaram que os pequenos lagos líquidos no hemisfério norte de Titã são surpreendentemente profundos, empoeirados no topo de colinas e repletos de metano.
Os novos achados, publicados na edição de 15 de abril da revista Nature Astronomy, são a primeira confirmação de quão profundos são alguns dos lagos de Titã (mais de 100 metros) e da sua composição. Fornecem novas informações sobre a forma como o metano líquido chove, evapora e se infiltra em Titã - o único corpo planetário no nosso Sistema Solar, além da Terra, conhecido por ter líquido estável à sua superfície.
Os cientistas sabem que o ciclo hidrológico de Titã funciona de maneira semelhante ao da Terra - com uma grande diferença. Em vez de ser água a evaporar-se dos mares, formando nuvens e chuva, Titã faz com metano e etano. Nós tendemos a pensar nestes hidrocarbonetos como gases na Terra, a menos que sejam pressurizados num tanque. Mas a lua Titã é tão fria que aqui estes elementos comportam-se como líquidos, como gasolina à temperatura ambiente no nosso planeta.
Os cientistas sabiam que os mares do Norte, muito maiores, estão repletos de metano, mas descobrir que os lagos menores pequenos são compostos principalmente por metano foi uma surpresa. Anteriormente, os dados da Cassini mediram Ontario Lacus, o único grande lago no hemisfério sul de Titã. Lá, encontraram uma mistura aproximadamente igual de metano e etano. O etano é um pouco mais pesado do que o metano, com mais átomos de carbono e hidrogênio na sua composição.
"De cada vez que fazemos descobertas em Titã, Titã torna-se mais misterioso," comenta o autor principal Marco Mastrogiuseppe, cientista de radar do Caltech em Pasadena, no estado norte-americano da Califórnia. "Mas estas novas medições ajudam a dar resposta a algumas questões-chave. Agora, podemos entender melhor a hidrologia de Titã."
Acrescentando às excentricidades de Titã, com as suas características parecidas às da Terra esculpidas por materiais exóticos, está o fato de que a hidrologia de um lado do hemisfério norte é completamente diferente da do outro lado, disse o cientista da Cassini e coautor Jonathan Lunine da Universidade de Cornell em Ithaca, Nova Iorque.
"É como se olhássemos, a partir de órbita, para o Pólo Norte da Terra e pudéssemos ver que a América do Norte tinha um cenário geológico completamente diferente para corpos líquidos do que a Ásia," explicou Lunine.
No lado leste de Titã, existem grandes mares com baixa elevação, desfiladeiros e ilhas. No lado oeste: lagos pequenos. E as novas medições mostram lagos empoeirados no topo de grandes colinas e planaltos. As novas medições de radar confirmam as descobertas anteriores de que os lagos estão muito acima do nível do mar, mas evocam uma nova imagem de formações terrestres - como mesas ou morros - centenas de metros acima da paisagem circundante, com lagos líquidos profundos no topo.
O fato destes lagos ocidentais serem pequenos - com apenas dezenas de quilômetros de largura -, mas muito profundos, também diz aos cientistas algo novo sobre a sua geologia: é a melhor evidência, até agora, de que provavelmente formaram-se quando o substrato rochoso e circundante de gelo e compostos orgânicos se dissolveu e colapsou. Na Terra, lagos de água idênticos são conhecidos como lagos cársicos. Situados em áreas como na Alemanha, na Croácia e nos Estados Unidos, formam-se quando a água dissolve rocha calcária.
Juntamente com a investigação de lagos profundos, um segundo artigo na Nature Astronomy ajuda a desvendar mais do mistério que é o ciclo hidrológico de Titã. Investigadores usaram dados da Cassini para revelar o que chamam de lagos transientes. Conjuntos diferentes de observações - de dados de radar a dados infravermelhos - parecem mostrar que os níveis de líquido mudaram significativamente.
A melhor explicação é que houve algumas mudanças sazonais nos líquidos à superfície, disse a autora principal Shannon MacKenzie, cientista planetária do Laboratório de Física Aplicada Johns Hopkins em Laurel, Maryland, EUA. "Uma possibilidade é que essas características transitórias podem ter sido corpos líquidos mais rasos que, ao longo da estação, evaporaram e se infiltraram no subsolo," realçou.
Estes resultados e as descobertas presentes no artigo da Nature Astronomy sobre os lagos profundos de Titã apoiam a idéia de que a chuva de hidrocarbonetos alimenta os lagos, que então podem evaporar de volta para a atmosfera ou drenar para o subsolo, deixando reservatórios de líquido armazenados por baixo.
A Cassini, que chegou ao sistema de Saturno em 2004 e que terminou a sua missão em 2017 quando mergulhou deliberadamente na atmosfera do planeta gigante, mapeou mais de 1,6 milhões de quilômetros quadrados de lagos e mares à superfície de Titã. Vê-lo com o seu instrumento de radar, que enviou ondas de rádio e recolheu um sinal de retorno (ou eco) que forneceu informações sobre o terreno e sobre a profundidade e composição dos corpos líquidos, juntamente com dois sistemas de imagem que podiam penetrar através da espessa neblina atmosférica da lua.
Os dados cruciais para a nova investigação foram recolhidos durante a última passagem rasante por Titã, no dia 22 de abril de 2017. Foi o último olhar da missão para os lagos menores da lua, que a equipe aproveitou ao máximo. A recolha dos ecos a partir das superfícies dos lagos pequenos, enquanto a Cassini passava por Titã, foi um desafio único.
"Este foi o último grande feito ousado da Cassini em Titã," concluiu Lunine.

Créditos: Astronomia On-line

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