segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Ceres - um dos fatores de mudança no prisma do Sistema Solar

Em Março de 2015, a missão Dawn da NASA alcançará o planeta anão Ceres, o primeiro da classe de planetas menores a ser descoberto e o mais próximo da Terra. Ceres, que orbita o Sol no cinturão de asteróides entre Marte e Júpiter, é um corpo único no Sistema Solar, tendo muitas semelhanças com a lua de Júpiter, Europa, e a lua de Saturno, Encelado, ambas consideradas como fontes potenciais para albergar vida. No passado dia 15 de Agosto, Britney Schmidt, cientista da missão Dawn, e Julie Castillo-Rogez, cientista planetária do JPL da NASA, falaram num Google+ Hangout com o nome "Ceres: Mundo Gelado Revelado?" acerca da crescente excitação em redor do corpo gelado mais próximo. "Eu acho que, na verdade, Ceres é como um divisor de águas no Sistema Solar," afirma Schmidt. "Ceres é sem dúvida o único da sua espécie." Quando Ceres foi descoberto em 1801, os astrônomos classificaram-no como planeta. O corpo massivo viajava entre Marte e Júpiter, onde os cientistas haviam previsto matematicamente a existência de um planeta. Observações posteriores revelaram que uma série de pequenos corpos entulhavam a região, e Ceres foi desclassificado para apenas mais um asteróide no cinturão. Foi só em 2006, quando Plutão foi classificado como planeta anão, que Ceres foi atualizado para o mesmo nível. Ceres é o corpo de maior massa no cinturão de asteróides, maior que algumas das luas geladas que os cientistas consideram ideais para albergar vida. Tem o dobro do tamanho de Encelado, a lua de Saturno que expele jatos e que pode esconder água líquida por baixo da sua superfície. Ao contrário dos outros asteróides, Ceres tem uma forma perfeitamente arredondada que sugere as suas origens. "O fato de Ceres ser tão redondo diz-nos com quase toda a certeza que se formou no início do Sistema Solar," afirma Schmidt. Ela explicou que uma formação posterior teria criado uma forma menos arredondada. A forma do planeta anão, combinada com o seu tamanho e massa total, revelam um corpo de densidade extremamente baixa. "Sob esta superfície empoeirada, suja, tipo-argila, pensamos que Ceres pode ser gelado," acrescenta Schmidt. "Pode até ter tido um oceano no seu passado." "A diferença entre Ceres e os outros corpos gelados [no Sistema Solar] é que é o mais próximo do Sol," realça Castillo-Rogez. A menos de três vezes a distância entre a Terra e o Sol, Ceres está perto o suficiente para sentir o calor da estrela, permitindo com que o gelo derreta e volte a solidificar. A investigação do interior do planeta anão pode fornecer informações sobre o Sistema Solar jovem, especialmente locais onde a água e outros compostos voláteis podem ter existido. "Ceres é uma espécie de guardião da história da água no meio do Sistema Solar," comenta Schmidt. Por maior que Ceres seja, é um desafio estudá-lo a partir da Terra devido à sua distância. Imagens obtidas pelo Telescópio Espacial Hubble forneceram algumas dicas em relação à sua superfície, mas para serem avistadas, as características não podem ter menos do que 25 km em diâmetro. Várias manchas circulares pintam o terreno, características que Schmidt diz poderem ser vários terrenos geológicos, incluindo potenciais bacias de impacto ou terrenos caóticos como aqueles encontrados em Europa. A maior delas, com o nome de Piazzi em honra ao descobridor do planeta anão, tem um diâmetro de aproximadamente 250 km. Se esta característica for uma bacia de impacto, provavelmente foi formada por um objeto com aproximadamente 25 km em diâmetro. Mas para Schmidt, esta é uma outra possível indicação acerca da superfície do planeta anão. "Isto não significa que Ceres não tenha sido atingido por algo maior que 25 km," afirma. "Significa apenas que o que quer que esteja acontecendo em Ceres não apagou totalmente [a assinatura topográfica desse evento]." Ceres pode ter sofrido grandes impactos, especialmente durante períodos de intenso bombardeamento no início da história do Sistema Solar. No entanto, se a superfície contiver gelo, essas características podem ter sido apagadas. Os telescópios na Terra também foram capazes de estudar a luz refletida do planeta e ler os seus espectros. "O espectro diz-nos que a água tem estado envolvida na criação de materiais à superfície," realça Schmidt. O espectro indica que a água está ligada ao material na superfície de Ceres, formando uma argila. Schmidt comparou-a com a recente descoberta de minerais pelo rover Curiosity à superfície de Marte. "[A água está] literalmente banhando a superfície de Ceres," comenta. Além disso, os astrônomos descobriram evidências de carbonatos, minerais que se formam num processo que envolve água e calor. Os carbonatos são geralmente produzidos por processos de vida. O material original formado com Ceres misturou o material impactante ao longo dos últimos 4,5 bilhões de anos, criando o que Schmidt chama de "esta mistura de materiais ricos em água que encontramos em planetas habitáveis como a Terra e planetas potencialmente habitáveis como Marte." A água é considerada um ingrediente necessário para a evolução da vida como a conhecemos. Pensa-se que os planetas que podem ter contido água, como Marte, bem como luas que ainda a têm hoje, como Encelado e Europa, são ideais para albergar ou ter albergado vida. Devido ao seu tamanho e proximidade, Schmidt considera Ceres "sem dúvida mais interessante do que alguns destes satélites gelados. Se é gelado, deve ter tido um oceano em algum ponto do seu passado," realça. Castillo-Rogez comparou a Terra, Europa e Ceres, e descobriu que o planeta anão tem muitas parecenças com a Terra, talvez até mais do que a lua gelada de Júpiter. Tanto a Terra como Ceres usam o Sol como fonte principal de calor, enquanto que Europa recebe a maioria do seu calor a partir das interacções de maré com Júpiter. Além disso, a temperatura média à superfície do planeta anão varia entre os -143ºC e os -73ºC, em comparação com os 27ºC da Terra, enquanto Europa varia entre uns gelados -223ºC e -263ºC. "Pelo menos na linha do equador onde a superfície é mais quente, Ceres poderia ter preservado uma espécie de líquido," afirma Castillo-Rogez. A água líquida poderia existir noutros pontos do planeta anão, conhecidos como armadilhas frias, ou áreas permanentemente à sombra onde a água gelada poderia permanecer à superfície. Tais "poças" geladas já foram encontradas na Lua. "A química, atividade térmica, a fonte de calor e as perspectivas de convecção no interior do reservatório de gelo são os principais fatores que nos fazem pensar que Ceres já pode ter sido habitável pelo menos em algum momento da sua história," acrescenta Castillo-Rogez. À medida que os cientistas desenvolvem mais informações sobre Europa e Encelado, tem havido uma maior atração para investigar os dois locais privilegiados para a vida. Mas Schmidt e Castillo-Rogez pensam que Ceres também poderia trazer grandes benefícios para a astrobiologia e exploração espacial. "Não é um ambiente difícil de investigar," afirma. "Quando pensamos no futuro das missões com rovers ou até tripuladas, porque não visitar Ceres?" Apesar de que seria mais difícil perfurar Ceres do que Europa, que possui uma camada superficial de gelo, o planeta anão seria um ótimo local para conduzir um rover. Schmidt também realça que poderia ser um esplêndido ponto de partida quando se trata de alcançar o Sistema Solar exterior. A sua massa menor tornaria mais fácil os pousos e descolagens do que em Marte, o que o tornaria num bom local para missões tripuladas. "Neste lugar especial do Sistema Solar, temos um objeto único que pode dizer-nos muito mais sobre a construção de um planeta habitável." A missão Dawn da NASA foi lançada no dia 27 de Setembro de 2007. Viajou até ao asteróide Vesta, onde permaneceu em órbita entre Julho de 2011 e Julho de 2012, antes de partir em direção a Ceres. Está programada para passar cinco meses estudando o planeta anão, embora Schmidt tenha expressado o desejo de que a sonda continue a trabalhar para lá da missão principal, permitindo com que a equipe estude o corpo gelado por mais tempo. Castillo-Rogez acrescenta que não só irá a Dawn alcançar Ceres em 2015, como também a sonda Rosetta da ESA chegará no mesmo ano ao cometa Churyumov-Gerasimenko, e que a sonda New Horizons da NASA chegará a Plutão e à sua lua Caronte. "2015 vai ser um grande ano para os corpos gelados," conclui Castillo-Rogez. "Eu acho que quando alcançarmos Ceres, vai ser um grande divisor de águas, uma nova janela para o Sistema Solar que não teríamos sem ir lá," conclui Schmidt.

Fonte: Astronomia On-line

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